Curta n° 01
O defunto me disse:
- Acorda, e fica de pé.
Obedeci, pois só isso tinha eu a prestar à sua posição. Calado eu estava, nostálgico, no cemitério de minhas lembranças; sentado, remoendo cá comigo as minhas queixas.
Fiquei de pé.
- Vem mais pro lado. Assim.
Minha sombra caiu como um lençol em sua face roída, furadinha, porosa feito queijo. Ele cochilou com prazer. Afinal, o sol ardia como mil labaredas de fundição. A terra se esfarelava sob seus cabelos ralos, mas servia como um galante travesseiro.
- Olha, meu jovem... No meu tempo!...
Não ouvi o resto. Distraidamente fiquei concentrado na larva que saía de sua narina. Ela, sim, era abrilhantada de poesia.
Comentários